segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

A solução clássica de Alfred Tarski.

O cretense Epiménides diz: “todos os cretenses são mentirosos.”
Se disse a verdade, como é cretense, então mentiu e o que disse é falso. Se não disse a verdade, isto é, se mente, então os cretenses não são mentirosos e Epiménides também o não é. Então ao mentir diz a verdade.
Os paradoxos mostram a dificuldade de tentar que uma frase declarativa diga qualquer coisa acerca da sua própria verdade ou falsidade.
Repare nas seguintes afirmações:

Lisboa é a capital de Portugal.
Lisboa é um substantivo.
Em Lisboa desagua o Tejo.
Lisboa tem seis letras.

A que nos estamos a referir ao falar de Lisboa? Na primeira e na terceira frase falamos de Lisboa cidade; na segunda e na quarta referimo-nos à palavra Lisboa. Por isso os lógicos distinguem a designação do designado. O designado é o ser, o ente ou a entidade a que o termo se refere.
Quando nos queremos referir à palavra e não à realidade que ela nomeia colocamos o termo entre aspas simples. Assim, para evitar confusões nos exemplos anteriores deveríamos escrever:

‘Lisboa’ é um substantivo.
‘Lisboa’ tem seis letras.

A distinção entre designação e designado está intimamente ligada à distinção entre linguagem e metalinguagem, pois para falarmos de uma linguagem objecto teremos de nos servir de uma metalinguagem. Este refinamento conceptual serviu para tentar ultrapassar os paradoxos.
A solução clássica deve-se à utilização do conceito de metalinguagem (apresentado por Alfred Tarski). As frases sobre a realidade (como «o céu é azul») são em linguagem-objecto ou linguagem de nível zero (linguagem objectiva); mas as frases sobre os valores lógicos (verdadeiro ou falso) devem ser feitas em metalinguagem ou linguagem de nível superior.
Assim, a frase «o céu é azul» é em linguagem-objecto, mas a frase «'o céu é azul' é verdadeira» é feita em metalinguagem ou linguagem de nível um. Se pretendermos falar do valor de verdade desta última frase, teremos que utilizar uma linguagem de nível superior. No exemplo seguinte,

1. As maçãs são azuis;
2. A frase 1 é falsa;
3. A frase 2 é verdadeira,

A frase 3 é escrita numa linguagem de nível superior à metalinguagem da frase 2.
O que este conceito de metalinguagem faz é “proibir” que as frases sobre a realidade se refiram ao (seu) valor de verdade.

Alexandre Marques

3 comentários:

Stoa disse...

Alexandre,
Vê se este exemplo é adequado à solução de Tarski (que uma frase em linguagem objecto não pode referir-se ao seu valor de verdade, porque isso não faz sentido): "este quadro é falso". Parece que este exemplo mostra mais ostensivamente que, quando incluímos uma referência ao valor de verdade numa frase de grau zero ou linguagem-objecto, a frase se torna absurda. Porém, a estrutura é a mesma dos exemplos de paradoxos semânticos abordados.

Paulo Lopes

Stoa disse...

Olá Paulo,
De facto, o teu exemplo ilustra claramente a dificuldade que deriva do facto de uma frase em linguagem objecto se referir em simultâneo ao seu valor de verdade. No entanto, e no seguimento de algumas conversas que tivemos, parece consensual que a solução de Tarski apresenta algumas limitações. Com tempo, espero poder explorar, estudar e compreender, a solução de Kripke para o problema.
Abraço.

Stoa disse...

Viva, Alexandre.
Uma das limitações da solução de Tarski que Kripke aponta diz respeito à deselegância estrutural, não é? Mas esse é o problema das teses que permitem uma regressão ou progressão teoricamente interminável. É análogo ao problema da fundamentação da indução (tal como abordado por Hume e por Popper): também não me parece que haja alguma consensualmente satisfatória - a não ser que as posições fiabilista (de Fred Dretske, por exemplo), coerentista e behaviorista do conhecimento sejam consideradas satisfatórias.
Temos que ver isso do Kripke!
Abraço.

Paulo