sábado, 4 de abril de 2009

Uma espécie de paradoxo: corvos pretos, coisas não pretas


Embora conhecido por paradoxo dos corvos (ou paradoxo de Hempel), não é verdadeiramente um paradoxo (não gera propriamente uma contradição), mas talvez antes uma perplexidade sobre o sentido das evidências empíricas na confirmação de teorias científicas. Foi a propósito da confirmação de teorias ( 'confirmação' significa aqui "apoio indutivo" mais ou menos forte) que Carl Gustav Hempel (nascido na Alemanha, em 1905, e falecido nos Estados Unidos, em 1997, para onde emigrara em 1939) apresentou este 'paradoxo', em 1943. 
Vejamos as seguintes proposições:
(1) Todos os corvos são negros. 
(2) Todas as coisas que não são negras não são corvos. (Ou: Todas as coisas não-negras são não-corvos).
Como ambas são logicamente equivalentes, o que confirmar (1) (no sentido de reforçar a hipótese de ser verdadeira) confirma (2) e vice-versa.
Assim, numa perspectiva verificacionista, cada corvo negro observado reforça a possível verdade de que todos os corvos são negros; mas qualquer coisa de qualquer cor que não o negro fará logicamente o mesmo serviço - algo que se pode fazer sem sair do sofá. Ora, é esta conclusão (de que tudo o que não é negro - como o meu carro cinzento, uma maçã vermelha ou o gato castanho da minha vizinha - confirma que todos os corvos são negros) que surge como insensata ou absurda. Agora, se aceitarmos esta noção contra-intuitiva de confirmação, então o meu carro cinzento ou uma maçã vermelha (que são coisas não-brancas e não-corvos) também confirmará a proposição "Todos os corvos são brancos"!* Paradoxalmente, o mesmo objecto serviria para confirmar duas teses antagónicas.

Paulo Lopes
* Supondo, é claro, que não tivéssemos observado nenhum contra-exemplo (nomeadamente, um corvo negro)
P.S.: Para uma abordagem mais robusta e matizada (incluindo as soluções apresentadas), consulte-se, por exemplo, António Zilhão: