domingo, 18 de setembro de 2011

O Génio Maligno: cérebros numa cuba — a crítica de Hilary Putnam


Imagine que o supercomputador é tão avançado e eficiente que logra fazê-lo crer que está sentado a ler estas palavras sobre o divertido e tresloucado cenário de um cientista que é capaz de retirar o cérebro de uma pessoa e colocá-lo numa cuba com nutrientes! Sempre há gente com uma imaginação! — pensa o leitor, com um sorriso complacente ou impaciente.
Se porventura o leitor for um cérebro numa cuba (hipótese que, aparentemente, não consegue excluir), então a maior parte das suas crenças sobre o mundo terão que ser falsas.
Tal como Descartes, porém, Putnam faz o papel de advogado do diabo — e, convenhamos, que engenhosa armadilha lançaram aos céticos! Mas agora, diriam eles — a machadada final ou o golpe de misericórdia nas ambições do cético, conforme as sensibilidades —, temos que pôr fim à brincadeira e mostrar que este cenário é incoerente. Putnam lança-se afoitamente à tarefa (se o leitor fosse um cérebro numa cuba, se pudesse saber que é um “cérebro numa cuba”, então a ilusão em causa seria ao mesmo tempo verdadeira! Ou seja: “se sou um cérebro numa cuba, então ‘sou um cérebro numa cuba’ é falso").
Parece-lhe convincente? Há quem tenha reservas. Mas há que reconhecer que consegue, pelo menos, mostrar que um cérebro numa cuba não poderia ter a crença (saber) que é um cérebro numa cuba.

Paulo Lopes

2 comentários:

julio disse...

Estou confuso, preciso de esclarecimento adicional. Fiquei com a impressão que o argumento supõe que se sou um cérebro numa cuba, todas as minhas a crenças devem ser falsas e não apenas algumas (a esmagadora maioria, talvez, não interessa). É assim? é assim por hipótese? ou isso é deduzido do ser cérebro na cuba? Se for por hipótese, é demasiado arbitrária; se não o for, não vejo como é feita a dedução...

Phronesis disse...

Se bem entendo, Júlio, a tua questão é sobre este período: "Se porventura o leitor for um cérebro numa cuba (hipótese que, aparentemente, não consegue excluir), então a maior parte das suas crenças sobre o mundo terão que ser falsas." Também não vejo como poderia ser de outro modo: pois se ('por hipótese') vives numa ilusão sistemática sobre a natureza da realidade ou sobre a correspondência das tuas perceções com o mundo externo (ou seja, se és um cérebro numa cuba), claro que as tuas crenças sobre a realidade serão ilusórias. Sugeres que isto (que a maior parte das tuas crenças sobre a realidade são falsas, porquanto ilusórias) pode ser disputado? Parece que também eu preciso de esclarecimento adicional.
Um cenário que ilustra aquela ideia (de que a maior parte das crenças de um 'cérebro encubado' serão falsas): se a ciência pudesse, em caso de destruição maciça do corpo com a preservação temporária do cérebro,
para ser transplantado para um corpo de um dador, e a lista de espera fosse interminável, a solução de ligar cada um desses cérebros a um supercomputador capaz de dar a ilusão de que se é um corpo vivendo no mundo real (tal como conhecido anteriormente) significaria que, um dia (o dia da ligação do cérebro ao tal supercomputador), essa mente teria a vívida impressão de acordar no hospital, de ser informada que o transplante tinha corrido muito bem e que podia ir para casa continuar a viver a sua vida (tal como no filme Matrix). Como poderia 'alguém' nesta situação ter perceções diferentes das minhas ou das tuas? Mas alguém (a começar pelos médicos) saberia que isso era uma ilusão.